Avanços recentes na radioterapia

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Adaptado da apresentação do Dr. João Victor Salvajoli. Caso deseje assistir a palestra na íntegra, clique aqui.

O câncer no mundo e no Brasil

O câncer vem aumentando a sua incidência particularmente nos países em desenvolvimento. Conforme a Agência Internacional de Energia Atômica, o número de casos de câncer nesses países, quando comparado com países considerados desenvolvidos, em algumas faixas etárias chega a superar a taxa de mortalidade por doença cardíaca. De acordo com essa classificação, nos países desenvolvidos (mais industrializados e com maior renda per capta) o câncer tem sido a causa principal de mortalidade, porém, no Brasil, ele já é a segunda maior causa de mortalidade.

Dados do INCA demonstram que para uma população de 213 milhões de habitantes, o Brasil tem cerca de 690 mil novos casos de câncer por ano, enquanto nos Estados Unidos, a média de pessoas diagnosticadas é de 1,8 milhão para uma população de 331 milhões. No entanto, o número referente a realidade brasileira pode estar subdimensionado, já que o país não possui uma notificação compulsória. Dessa forma, é possível supor que atualmente o país tem em torno de 900 mil novos casos por ano. 

A radioterapia no tratamento do câncer

A radioterapia tem um papel fundamental no controle do tumor, muitas vezes colaborando com a cirurgia e/ou quimioterapia. Porém, ela carrega ainda um grande dilema, a definição do índice terapêutico: a razão entre o controle tumoral e o risco de complicações.

Nós vemos, graficamente, que a taxa de controle do tumor versus o risco de complicações, algumas vezes se aproxima perigosamente. E é neste ponto que entram os avanços da especialidade que permitiram diminuir de forma direta a morbidade que, frequentemente, era vista no passado.

A evolução histórica

Do ponto de vista da evolução histórica, a radioterapia passou a ser empregada com a finalidade terapêutica logo após a descoberta dos raios-X, em 1895, passando por etapas evolutivas como a introdução da unidade em cobalto, na década de 50, o primeiro acelerador instalado em Palo Alto, ao lado da Universidade de Stanford, e, recentemente, as melhorias tecnológicas. Isso não ocorreu apenas por meio do desenvolvimento de novos equipamentos, mas também em conjunto com a melhoria das imagens que passaram a permitir um planejamento de mais qualidade, em conjunto com o desenvolvimento de softwares que permitem um planejamento tridimensional mais seguro. 

Nos anos 60, o planejamento era realizado por meio de julgamento clínico, exame clínico e imagens não sofisticadas em conjunto com um planejamento bastante simples, chamado de 2D. 

No entanto, com o passar do tempo, houve uma melhora das imagens que têm auxiliado bastante no planejamento e na realização da radioterapia, algo que permitiu mais sofisticação do planejamento e, consequentemente, a melhoria dos equipamentos na entrega da dose. Assim, do ponto de vista de uma linha do tempo, os profissionais migraram da radioterapia 2D para a radioterapia 3D, seguindo para a modulação da intensidade do feixe e mais recentemente para as técnicas estereotáxicas de radiocirurgia e os feixes de partículas de prótons ou partículas pesadas como o Carbon Ion que também tem colaborado bastante para melhoria da técnica de radioterapia.

A evolução dos equipamentos

Entre os equipamentos mais novos, utilizados para a realização da radioterapia, o acelerador linear acoplado com métodos de IGRT é um dos destaques. Ele consegue realizar uma reconstrução tomográfica após o posicionamento do paciente que, antes do início da sessão, tem a tomografia fundida à tomografia ou ressonância de planejamento para que os milímetros que precisem de correção possam ser acertados imediatamente antes do início do tratamento. 

Existe também o Gamma Knife, que possibilita um tratamento absolutamente preciso para lesões intracranianas com técnicas radiocirúrgicas. Mais recentemente, outros equipamentos ainda mais sofisticados com a integração da ressonância magnética com o acelerador linear, como o Elekta Unity, que permite uma definição ainda melhor do volume alvo e suas relações com os tecidos normais. Isso sem contar os exemplos de equipamentos e de técnicas de radioterapia ou cargas na concentração da dose e proteção dos tecidos normais, como é o caso do IMRT, que gerou um grande avanço na técnica de entrega de dose, permitindo a melhor modulação da intensidade do feixe. 

Gamma Knife
Elekta Unity

Nesse período de desenvolvimento também aconteceram avanços da integração de imagens, no software de cálculos e planejamento, no sistema de entrega de dose e, recentemente, uma das preocupações mais latentes é o controle da movimentação de órgãos, como pode acontecer com um paciente com câncer de próstata que apresente alteração na forma e no volume do reto pela presença de gases ou fezes. Algo que até pouco tempo atrás poderia alterar a dinâmica do tratamento, mas que hoje já é contornado graças a ferramentas chamadas IGRT ou Radioterapia Guiada por Imagens, tecnologia que permite identificar o alvo em tempo real, compreendendo como estão as suas estruturas normais e adaptando a entrega da dose, melhorando a eficácia do tratamento.

Outra tecnologia importante para a melhoria do tratamento nesse sentido é a Cone Beam que realiza uma reconstrução tomográfica no aparelho, permitindo confrontar essa imagem em relação à tomografia de planejamento e também à ressonância acoplada ao acelerador, possibilitando uma identificação mais nítida das estruturas normais, distribuindo menos radiação nos tecidos ao redor do alvo.

Estes são avanços que vêm ocorrendo, fundamentalmente, a partir do século XXI e que transformaram a radioterapia em uma especialidade diferente. Isso também é traduzido como parte de uma rotina de grande complexidade, já que o serviço de radioterapia tem desde recursos de planejamento, de entrega de doses, de imobilização, sistema eletrônico de prontuário e de verificação até o controle de qualidade. Processos que aumentaram exponencialmente a complexidade do tratamento. 

Evolução na entrega de doses

Como parte de todos esses avanços, a radiocirurgia é um exemplo claro de uma perfeita entrega de dose com precisão submilimétrica e tem várias indicações, entre elas a utilização mais comum na metástase cerebral, onde é realizada uma extrema concentração de dose em fração única e altamente delimitada sobre o alvo, através de planejamentos com ressonância, tomografia e cálculos sofisticados com a ajuda de sistemas de planejamentos delicados.

A radiocirurgia começou a ser utilizada para o tratamento de lesões intracranianas e os resultados foram tão bons que surgiram os questionamentos naturais sobre o porquê de não utilizá-la em outras partes do corpo, algo que passou a acontecer posteriormente e hoje é chamado Radioterapia Estereotáxica Fracionada ou SDRT.


Fonte: Elekta.com

Outra preocupação atual para melhorar o resultado dos tratamentos é a correção da movimentação, já que os órgãos extracranianos, em sua maioria, tem algum tipo de movimento. No entanto, atualmente, já existem ferramentas que permitem acompanhar o alvo dinamicamente durante o tratamento e, através de mecanismo de controle da respiração, irradiar em um determinado ciclo. 

Por exemplo: irradiar na inspiração e não irradiar na expiração. Possibilidade que permite tratar o paciente com precisão e correção da movimentação do alvo, decorrente do movimento do órgão onde o tumor se instalou. A máquina utilizada para isso apresenta um sistema de imobilização com sofisticado processo de controle da reprodutibilidade e do movimento respiratório, proporcionando resultados fantásticos. Esses avanços não podem ser ligados só a melhoria de imagem, de software, de aparelho, de entrega e de controle de entrega, mas também, fundamentalmente, a melhoria da equipe multiprofissional, de forma que nada é feito sem que um grupo discuta sobre qual é a melhor alternativa de tratamento para cada paciente. E justamente essa possibilidade de trabalhar com profissionais experientes em diversas áreas tem permitido um enorme avanço, não só técnico, mas de equipe e de integração que ajuda muito na melhora dos resultados oncológicos.

Os possíveis desdobramentos da radioterapia

A radioterapia hoje tem também um outro tipo de atuação muito dinâmica, na qual se integra com drogas-alvo da imunoterapia. Ou seja, a radioterapia também estimula o sistema imune a reagir contra o tumor e a responder melhor à imunoterapia. Algo que traz para o centro da conversa o efeito abscopal, descrito em algumas situações nas quais o tratamento de uma determinada lesão permite, através dessa imunoestimulação e da integração com drogas-alvo, a agressão de outras lesões não submetidas ao tratamento irradiante.

Essa integração tem crescido bastante e, em várias situações anatômicas onde é possível a integração de radioterapia, quimioterapia, imunoterapia ou outras drogas-alvo, uma nova modalidade de tratamento tem florescido.

Por fim, as próximas décadas tanto para o profissional da radioterapia quanto a especialidade, devem ser afetadas não só pelas melhorias da técnica e da tecnologia. Afinal, os profissionais médicos acreditam em uma prevenção cada vez melhor contra o câncer, algo que, talvez diminua a incidência e também a indicação da radioterapia.

Com este cenário em perspectiva, é possível imaginar que, em um futuro próximo, a detecção precoce se torne mais factível e com isso os tumores para serem tratados seriam menores, gerando uma integração entre radioterapia e cirurgia. A evolução da radioterapia tem acontecido de forma exponencial e novas evoluções, sejam através de novas tecnologias ou técnicas, devem continuar acontecendo.


Este resumo foi baseado na palestra do Dr. João Victor Salvajoli, que pode ser assistida na íntegra aqui.

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