Radioterapia e oligometástases: 1 x 24 Gy versus 3 x 9 Gy — um estudo prospectivo de fase III

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Historicamente, o estado oligometastático foi definido por Hellman-Weichselbaum, que hipotetizaram que esta seria uma fase transitória entre a neoplasia localizada e a disseminada polimetastática, onde, possivelmente, haveria papel para terapias locais ablativas e até, eventualmente, cura. 

Atualmente, existem diversas evidências de estudos clínicos prospectivos que mostram o aumento da sobrevida global e sobrevida livre de progressão com a ablação direcionada à lesão oligometastática com radioterapia estereotática ablativa corpórea (SBRT ou SABR).  Entretanto, a dose e o esquema ideal ainda não são bem estabelecidos. Um estudo prévio de escalonamento de dose, fase 1, mostrou que dose única ultra-alta de 24 Gy era necessária para se alcançar máximo controle tumoral. Após estes resultados, estudos de fase II confirmaram que 24 Gy era factível e efetivo em diversos cenários clínicos oligometastáticos. Além disso, como vantagens adicionais, quando comparadas aos esquemas de fracionamento convencionais, doses ablativas ultra-altas (a partir de 12 Gy) apresentam mecanismo de ação dual, com disfunção vasoativa transitória microvascular e supressão do reparo homólogo do dano ao DNA das células tumorais. 

Perante este cenário, foi realizado um estudo prospectivo, randomizado, fase III, testando se doses ablativas ultra-altas, em uma única fração, aumentariam o controle local em lesões oligometastáticas quando comparado com esquema padrão hipofracionado ablativo de 3 frações de 9 Gy. O desfecho secundário foi de toxicidade e avaliação dos padrões clínicos de progressão metastática. 

O estudo recrutou 117 pacientes, randomizados para receber 24 Gy em uma fração ou 3 frações de 9 Gy. O total de lesões oligometastáticas foi 154, isto é, os pacientes deveriam ter menos de 5 lesões metastáticas em ossos ou linfonodos, com dimensão máxima menor que seis centímetros. O controle local no campo irradiado e padrões de progressão metastática eram determinados através de PET-CT, tomografia (TC) ou ressonância (RM) periódicos. Com seguimento mediano de 52 meses, 59 pacientes com 77 lesões foram randomizados para receber 24 Gy em 1 fração, enquanto 58 pacientes com 77 lesões receberam 3 frações de 9 Gy. A maioria dos pacientes (47%) tinha como sítio primário a próstata.

É de extrema importância destacar que todos os pacientes foram tratados com radioterapia guiada por imagem, com correções online usando cone beam (kV-CBCT). Todas as lesões receberam 2 a 3 mm de margem do CTV para definição do PTV, que não deveria ter sobreposição com órgãos de risco críticos. O CTV era definido nas imagens de base, que poderiam ser feitas por PET-CT ou RM. Para propósito de delineamento, o GTV definido radiograficamente foi considerado o mesmo que o CTV. A dose era prescrita na curva de isodose de 100%, que englobava todo o PTV. 

Foram observados os seguintes dados:

 1 x 24 Gy3 x 9 Gy
Incidência cumulativa de recorrência local em 2 anos e 3 anos ( p=0,0048)2,7% e 5,8%9,1% e 22,0%
Incidência cumulativa de progressão metastática distante em 2 e 3 anos (p=0,01)5,3%10,7%

Um achado interessante foi o de que 50% dos pacientes que apresentaram recorrência local, tiveram também progressão à distância, enquanto entre os que controlaram localmente, apenas 7% progrediram à distância. Não foram observadas diferenças na incidência de toxicidades grau 2 ou 3 entre os esquemas. A incidência de fraturas pós tratamento foi baixa, sendo de 2,6% grau 3 em ambos os regimes.

Como limitações do estudo, os autores destacam o número relativamente pequeno de pacientes, com praticamente metade sendo de histologia prostática, e ainda curto seguimento. Além disso, a baixa incidência de fraturas pode ter sido devido a tumores menos avançados, com menor destruição cortical presente. Desta forma, os autores destacam que o esquema de 24 Gy deve ser considerado com cautela em pacientes com metástases em ossos longos ou ossos de alta carga mecânica.

Este estudo fornece evidência randomizada que 24 Gy em dose única é associado à maior controle local tumoral, com menor progressão clínica metastática. Pacientes tratados com 3×9 Gy apresentaram um aumento de quatro vezes das recorrências no campo da radioterapia e na disseminação metastática, em três anos. Assim, estratégias curativas associando terapia sistêmica e terapias locais ablativas antes da doença se tornar polimetastática é, definitivamente, uma promessa para o futuro.

Dr Alan Dal Pra, radio-oncologista e professor associado da University of Miami, Miller School of Medicine, comenta o estudo prospectivo, randomizado, fase III

Conteúdo desenvolvido por Dra. Maria Thereza (@TherezaStarling / @mthzams), Dr. Fábio Y. Moraes (@fabiomoraesmd / @drfabio.moraes) e time Câncer em Foco com base em:

Phase 3 Multi-Center, Prospective, Randomized Trial Comparing Single-Dose 24 Gy Radiation Therapy to a 3-Fraction SBRT Regimen in the Treatment of Oligometastatic Cancer 

Michael J. Zelefsky, MD, Yoshiya Yamada, MD, Carlo Greco, MD,Eric Lis, MD, Heiko Scho ̈der, MD, Stephanie Lobaugh, MS, Zhigang Zhang, PhD, Steve Braunstein, MD,{ Mark H. Bilsky, MD, Simon N. Powell, MD, PhD, Richard Kolesnick, MD, and Zvi Fuks, MD

Este resumo foi baseado neste conteúdo https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/33422612/.

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